Handebol brasileiro tem futuro ameaçado por falta de verbas e patrocínios
- Cláudio Moura
- 19 de abr. de 2019
- 5 min de leitura

Os desmandos, a falta de transparência na gestão e as denúncias de corrupção na Confederação Brasileira de Handebol começam a fazer estragos na estrutura das seleções e nos acampamentos e clínicas para revelar novos talentos.
O handebol brasileiro teve entre 2005 e 2018 o patrocínio de três das maiores estatais brasileiras: Petrobras, Banco do Brasil e Correios. Com o dinheiro destas empresas as estruturas para todas as seleções foram sensivelmente melhoradas; técnicos estrangeiros contratados; e dezenas de acampamentos realizados por todo o país, revelando talentos, muitos deles servem nossas seleções adultas e jogam na Europa.
Com o cessamento do patrocínio dos Correios, há poucos meses, a situação piorou. A CBHB sobrevive apenas das verba da Lei Agenelo/ Piva, que não atende as demandas da modalidade no que toca ao desenvolvimento de novos talentos e da estrutura ideal para as seleções.

A seguir, matéria completa produzida pelo site Globo.Esporte.com...
Dentro de quadra, o handebol brasileiro vive uma década promissora. Em 2013, as meninas foram campeãs mundiais pela primeira vez e até hoje colidem com as melhores seleções de igual para igual. Em 2019, entre os homens, em janeiro, o país terminou em nono lugar no Mundial da Alemanha/Dinamarca, melhor colocação da história. O resultado entre os meninos foi construído com ajuda de diversos nomes revelados e lapidados nos últimos anos pelos Acampamentos Regionais e Nacionais, nome dado ao projeto que desde 2005 descobria bons valores Brasil afora, mas que está "na gaveta" e corre o risco de acabar de vez.
Foram três oportunidades com acampamentos: 2005 e 2006, 2013 e 2014 e depois 2017 e 2018. Em 2005, o projeto aconteceu pela primeira vez. Foi repetido em 2006. Ali, havia uma parceria junto ao Ministério do Esporte, que aprovava a verba para sua execução. Desde 2013, os Correios entraram e passaram a investir parte de sua cota de patrocínio na base. Em 2017 e 2018, a iniciativa voltou a acontecer, agora com os dois naipes em igualdade. Mas para 2019 há um impasse, já que a estatal não renovou contrato. Hoje, a CBHb vive apenas com os R$ 2 milhões de 2019 da Lei Piva (com administração do COB, pois há determinação do TCU para interrupção do pagamento) e não há recursos para a sequência do trabalho.
É fácil ter uma ideia do tamanho do impacto dos Acampamentos no alto rendimento masculino. Mais de 90% da seleção adulta atual passou por lá. Chiuffa, João, Leonardo, Rogério, Toledo, Haniel, Bombom, Lucas Cândido, Ferrugem, Rudolf, Teixeira, Vinícius e Tchê foram revelados e lapidados ali. Todos estiveram no Mundial de 2019. Os trabalhos contaram com participação do técnico espanhol Jordi Ribera entre os homens. No passado, Morten Soubak também observou meninas em acampamentos, mas não estava à frente do trabalho.
Rogério Moraes, pivô que joga na Macedônia. Foi descoberto pelo projeto. Passou pelas seleções de base e chegou ao time adulto. Desde 2015 joga na Europa, passando por Vardar, Kiel e agora no Vezprem. Foi campeão da Champions League em 2017. Já Toledo atua na Polônia e no Mundial de 2019 foi um dos goleadores do torneio.

Fábio Chiuffa, ponteiro direito, um dos craques revelados nos acampamentos
Presidente da CBHb desde o afastamento de Manoel Oliveira no ano passado por questões ligadas à Justiça, Ricardo Souza garante que a entidade busca parceiros para manter o trabalho pelo país. Em 2013, quando anunciou o patrocínio para a CBHb, os Correios colocaram R$ 2 milhões para o desenvolvimento de valores. E entre 2017 e 2018, mais R$ 3,2 milhões foram deslocados para os Acampamentos, apesar da estatal não ser mais a patrocinadora master da modalidade.
Deste valor, prestação de contas dos Correios mostra que apenas R$ 274 mil foram utilizados em 2017. O trabalho abrangia as categorias infantil, cadete e juvenil. Sem esse dinheiro, a CBHb corre atrás da iniciativa privada e também busca apoio no Comitê Olímpico do Brasil para manter a ação. Vale lembrar que entre 2011 e 2018 o handebol brasileiro recebeu praticamente R$ 89 milhões em verbas e patrocínios.
"Estamos trabalhando para que o projeto aconteça ainda, com a iniciativa pública e privada", limitou-se a dizer o presidente.
Em 2017 e 2018, agora com igualdade entre os dois naipes, a programação prometia desenvolver 35 atletas em cada categoria, totalizando 210 por estado, nas 26 federações. Desses, 66 seriam selecionados para os acampamentos nacionais em todas as categorias. Vários desses, principalmente do projeto de 2005 e 2006, foram integrados para treinos com a seleção brasileira, se destacaram e ficaram entre os adultos. Alguns fecharam contratos na Europa. Washington Nunes, técnico da seleção adulta masculina e que foi coordenador do projeto, explica a sua importância.
- É um dos melhores projetos de categoria de base de uma confederação. Temos a oportunidade de fazer um trabalho único de seleções e formar treinadores também. Descobrir talentos. Se acaba isso, os atletas vão se desenvolver nos seus clubes, mas vão perder o diálogo. Estamos negociando com o COB e é bem mais possível que continue. Mais de 90% da atual seleção masculina passou e foi detectada nos acampamentos.
Pontualmente foram feitos alguns acampamentos femininos. Tivemos mais masculinos, mas nos dois últimos anos marcamos mais o feminino também. Isso dá uma dimensão da importância desse trabalho que é feito - diz Nunes.
Com as meninas, a ação foi diferente por motivos óbvios. Elas desbravaram a Europa primeiro. Pensando em seleção, em 2011, a CBHb firmou parceria com o clube austríaco Hypo. Lá, as meninas passaram a jogar juntas torneios de alto nível na Europa. Eram comandadas pelo mesmo técnico da seleção, o dinamarquês Morten Soubak. Dois anos depois do começo desse trabalho, o time foi campeão mundial na Sérvia, em 2013. Antes, em Londres 2012, ficaram em quinto lugar. O trabalho terminou em 2014 e cada brasileira rumou para um clube no exterior.

Um registro de um acampamento da CBHb
Nos últimos anos, a CBHb vem sofrendo com asfixia financeira pós-Rio 2016. A entidade tinha patrocínio dos Correios e do Banco do Brasil. Mas perdeu ambos. Primeiro o Banco deixou de patrocinar a entidade no início de 2018. E nos últimos meses os Correios não renovaram o patrocínio. Assim, o handebol brasileiro sobrevive apenas com pouco mais que R$ 2 milhões vindos do COB através da Lei Agnelo Piva. O dinheiro é usado para custeio operacional da CBHb e também para períodos de treino e competição das seleções adultas e de base.
Por conta dessa falta de verbas, o handebol brasileiro chegou a ficar de fora de torneios internacionais como mundiais de base. E também em 2018, a Polícia Federal desencadeou a Operação denominada "Sete Metros", que cumpriu 15 mandados de busca e apreensão em seis cidades do país. Em Sergipe foram três mandados cumpridos: um na casa do então presidente, Manoel Luiz. Segundo a PF, as investigações apontam desvio de R$ 6 milhões repassados pela União, através do Ministério do Esporte, para a realização do Campeonato Mundial de Handebol Feminino no Brasil, em 2011, durante o ciclo preparatório para os Jogos Olímpicos Rio 2016.
